quarta-feira, 17 de junho de 2009

Zen & Matrix

Hoje li um ditado Zen e lembrei do filme Matrix. Aparentemente eles não tem muito em comum. Aparentemente...

O ditado:

“No começo as montanhas são montanhas, os rios são rios e as florestas são florestas. No meio, montanhas não são mais montanhas, os rios não são mais rios e as florestas não são mais florestas. Ao final, montanhas são montanhas, rios são rios e as florestas são florestas.”

Parece enigmático, mas não é. O filme Matrix parece ser apenas uma aventura. Também não é.

Matrix é o mundo das aparências. Ela permeia tudo o que acontece ou faz com que aconteça. "Matrix” poderia ser traduzido do sânscrito (três ilusões) apontando para as três ilusões que ocultam a realidade, segundo o hinduísmo: a ilusão física, a ilusão psíquica e a ilusão espiritual. No filme, Neo é um personagem que está inserido na Matrix, como todos os demais. Ou quase todos. Para ele, as montanhas são montanhas, os rios são rios e as colheres são colheres. O coelho ainda não apareceu... Acredita piamente ser o personagem (um hacker muito famoso) que lhe disseram ser. As oportunidades de ver as coisas sob outro prisma aparecem o tempo todo, mas ele ainda ”não está pronto”. Tem medo de dar o salto. É preso pelos agentes da Matrix que lhe injetam um controlador interno...

Mas o acaso ali está, sempre disponível para que se tropece nele. Para Neo, na figura do coelho sonhado, visto “por acaso” nas costas tatuadas de uma moça. E ele o segue. Encontra-se com Trinity, a figura feminina que o leva ao “mestre dos outsiders”, que atende pelo sugestivo nome de Morpheus...

Morpheus lhe dá outra oportunidade (the red pill), mais “radical”. Para ir adiante, precisa coragem. Dar o salto, confiar. Agora ele faz. Engole a “red pill”. E inicia (ou continua) o seu acordar para a realidade além da Matrix...

Tudo se transforma... As montanhas não são mais montanhas, as colheres deixam de ser colheres – até entortam ao serem olhadas. Nem mesmo o seu velho conhecido - o espelho - é real (ele toca num e é por ele envolvido – sua imagem quer devorá-lo...).

Ele renasce/acorda para a sua verdadeira natureza. Se assusta com o que vê. Vacila. Precisa ser “reconstruído”. Ainda não está pronto. “Sabe” que aquilo que ele vivia não era real, mas ainda se surpreende com a perfeição das ruas onde havia “vivido”, mesmo sabendo serem falsas.

Precisa ser treinado para poder usar as suas novas “habilidades” e conhecer os truques, senão será enganado novamente, da mesma forma que antes... Morpheus (seu mestre no momento) é vital. As provas são colocadas, uma a uma. Ele supera um a um os limites impostos ou sugeridos.

Chega a hora de voltar para a Matrix (ou market place?) para a prova derradeira, o confronto com a própria Matrix, representada pelo seu principal agente, Smith. Neste confronto ele ”morre” com um tiro (que ele acredita ser real). Ou seria uma bastonada do mestre Zen?? O personagem se foi. E aquilo que ele realmente é (motivado pelo amor de uma mulher – é um filme americano) é “chamado” a se expressar. Definitivamente. Renasce. E “vê” as coisas como realmente são: no filme, números (bits) em sequência – representação do lado esquerdo do cérebro. Ele não se engana mais. As balas não são reais, assim como os agentes da Matrix. Ele está além das aparências. Transcendeu-as, apenas sendo o que sempre foi. Sua verdadeira natureza transcende naturalmente as aparências.

A partir daí, ele volta para o mundo. Usa a estrutura toda. Sabe que não é real, mas ele a usa, pois é onde as coisas parecem acontecer, o único local onde a linguagem tem algum valor. As montanhas voltam a ser montanhas, as colheres voltam a ser colheres. Dentro da Matrix. Ele sabe disso. Não se engana mais...

2 comentários

Anônimo disse...

Deva, nao me lembrava mais deste filme. Sua leitura é muito boa. Obrigada por ela e pelo resto do blog. Sua clareza é muito bem-vinda!
Beijos
Carla

Anônimo disse...

Senti vontade de rever o filme depois de ler o artigo. Fez sentido mas fiquei pensando se o diretor teve esta mesma ideia. abraços.
Reinaldo

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